O conto “O Nariz” tem início numa manhã fria de 25 de março de 1836, na cidade de S. Petersburgo, em casa do barbeiro Ivan Yakovlevitch. Depois de uma noite bem regada, este descobre um nariz no meio do pão. A mulher do barbeiro, cega de raiva, ordena ao marido que se desenvencilhe daquele horrendo estorvo. Uma terrível inquietude surge no coração de Yakovlevitch. E se a polícia irrompe na sua casa para o levar preso? Terá o dono deste nariz dado pela falta do seu importante apêndice e virá ele atrás de Yakovlevitch para tirar satisfações? E será este evento obra do diabo ou da vodka emborcada na noite anterior? A aparição deste nariz no meio de um pão é um evento tão insólito que, abruptamente, o conto fica envolto num espesso e misterioso manto, difícil de dissipar.
O humor corrosivo de Gogol é aproveitado pela narradora Estefânia Surreira e pela pianista Eliana Veríssimo para escancarar, até à caricatura mais grotesca, o quotidiano de uma sociedade esclerosada, mergulhada em aparências. Assim, as personagens surgem “encapuzadas” com diversas e ridículas camadas de papéis sociais. A caricatura expande-se nos figurinos concebidos por Kátia Santos, e nos quais o artista plástico Mutes aplicou o seu universo de personagens "descubistas". Num diálogo multidisciplinar se fará a viagem ao universo gogoliano. Para o soberbo festim do surreal! Surge então uma questão essencial: E se o nariz afinal não fosse um simples nariz, mas sim uma qualquer outra protuberância do corpo ou do pensamento humanos?!